Escrevo neste papel, escrevo muito contente. No momento seguinte o papel é amassado e jogado no chão. Não costumava agir assim; afinal, ainda me lembro dos motivos da minha alfabetização. Eu não poderia, depois de tudo o que passei, permitir que meras palavras me fizessem renunciar a todas as minhas crenças e ideais.
Quando jovem, andava pelas ruas e observava o descaso da população pela natureza. Ela certamente não se preocupava em cuidar da cidade: garrafas e papéis jogados no chão compunham a paisagem. Eu me indignava com tal situação, mas era somente um menino de rua que nada podia fazer.
Descobri, por meio do diálogo entre dois senhores, um programa de coleta seletiva e reciclagem. Fui informado que era necessário saber escrever e, ao me declarar iletrado, disseram que só poderia trabalhar lá se aceitasse participar de um processo de alfabetização de adultos. Concordei e, sempre depois do trabalho, ia falar com o professor; e aquilo se tornou rotina.
Aprendi, sem maiores dificuldades, a ler e a escrever; havia me apaixonado pela língua portuguesa. Os professores ensinavam de Matemática a História, mas Biologia chamou-me a atenção. Logo estava na biblioteca pública pesquisando sobre o meu trabalho cansativo.Conheci de onde vem o papel em que agora escrevo (da celulose presente nas árvores) e que nem tudo que as pessoas jogam fora é lixo.
Não é lixo, pois muito ainda pode ser reaproveitado.Os lixões atrapalham a vida das pessoas, não só a visualização, mas a saúde. Apredi que os aterros sanitários são mais higiênicos e eficazes quando se trata da decomposição dos materiais. Larguei o meu emprego e comecei a recolher todo o "lixo" que via na rua, assim que descobri que alguns bueiros entopem por conta do desrespeito das pessoas.
Cansei-me depois que vi as crianças rindo do meu esforço e resolvi escrever. Redigia belas palavras; minha vida havida sido reciclada, publiquei alguns livros, poemas e logo depois estava jogando para trás o livro da minha vida, o meu ideal, e este não seria reutilizado.