apalavreado

adj.m. 1.aquele que não consegue descrever com palavras, 2. eu, 3. você, 4. os humanos em geral

domingo, 29 de março de 2009

Bem me quer

A menina na porta de casa com vestido de gala e uma rosa vermelha na mão.
A menina na porta de casa com o vestido de gala e uma rosa vermelha na mão e o rosto tampado para esconder a falta da maquiagem.
A menina na porta de casa com vestido de gala e uma rosa vermelha na mão e o rosto tampado para esconder a falta de maquiagem e balançava a flor.
A menina na porta de casa com vestido de gala e uma rosa vermelha na mão e o rosto tampado para esconder a falta de maquiagem balançava a flor e começava a despetalá-la.
A menina na porta de casa com vestido de gala e uma rosa vermelha na mão e o rosto tampado para esconder a falta de maquiagem balança e depetala a flor.
- Mal me quer.
A menina na porta de casa com vestido de gala e uma rosa vermelha na mão e o rosto tampado para esconder a falta de maquiagem atira a flor para longe que é logo atropelada por um carro.
E morre uma ilusão.

sábado, 28 de março de 2009

The sound of music

- Escute, escute!
- O que?
- Você só pode estar louca!
- Não é possível! Só eu estou escutando?
- O que?
- Ela endoidou.
- Lala,lalalalalala, lalalala!
- O que??!
- Realmente enlouqueceu!
- É só a música tentando dar um pouco de sentido a minha vida! Que droga! Vocês nunca vão me entender!
- O que?!
- É melhor irmos embora... Vai que pega...

quinta-feira, 26 de março de 2009

Party time

Dançava a toa ao ritmo do Elvis
One
Two
Three o'clock
Pés sangrando de tanto esforço para imitar o mestre
Four o'clock rock,
Five,
Six
E girando, girando fantasiou sua dança com seu príncipe...
Seven o'clock,
Eight o'clock rock
Nine
Caindo exausta no chão a música muda.
É a realidade que chega sem pedir licença

domingo, 15 de março de 2009

Resíduos da vida

Escrevo neste papel, escrevo muito contente. No momento seguinte o papel é amassado e jogado no chão. Não costumava agir assim; afinal, ainda me lembro dos motivos da minha alfabetização. Eu não poderia, depois de tudo o que passei, permitir que meras palavras me fizessem renunciar a todas as minhas crenças e ideais.
Quando jovem, andava pelas ruas e observava o descaso da população pela natureza. Ela certamente não se preocupava em cuidar da cidade: garrafas e papéis jogados no chão compunham a paisagem. Eu me indignava com tal situação, mas era somente um menino de rua que nada podia fazer.
Descobri, por meio do diálogo entre dois senhores, um programa de coleta seletiva e reciclagem. Fui informado que era necessário saber escrever e, ao me declarar iletrado, disseram que só poderia trabalhar lá se aceitasse participar de um processo de alfabetização de adultos. Concordei e, sempre depois do trabalho, ia falar com o professor; e aquilo se tornou rotina.
Aprendi, sem maiores dificuldades, a ler e a escrever; havia me apaixonado pela língua portuguesa. Os professores ensinavam de Matemática a História, mas Biologia chamou-me a atenção. Logo estava na biblioteca pública pesquisando sobre o meu trabalho cansativo.Conheci de onde vem o papel em que agora escrevo (da celulose presente nas árvores) e que nem tudo que as pessoas jogam fora é lixo.
Não é lixo, pois muito ainda pode ser reaproveitado.Os lixões atrapalham a vida das pessoas, não só a visualização, mas a saúde. Apredi que os aterros sanitários são mais higiênicos e eficazes quando se trata da decomposição dos materiais. Larguei o meu emprego e comecei a recolher todo o "lixo" que via na rua, assim que descobri que alguns bueiros entopem por conta do desrespeito das pessoas.
Cansei-me depois que vi as crianças rindo do meu esforço e resolvi escrever. Redigia belas palavras; minha vida havida sido reciclada, publiquei alguns livros, poemas e logo depois estava jogando para trás o livro da minha vida, o meu ideal, e este não seria reutilizado.

quarta-feira, 11 de março de 2009

True Life

- Um sorriso e eu morro de amor!
- Um oi e me acho o centro do mundo!
- Um abraço e meu coração pula do peito!
- Um beijo e eu surto de paixão!

A verdade é que nada disso é verdade. A verdade é que é tudo feito de mentiras.

terça-feira, 10 de março de 2009

Seis da manhã

Seis da manhã é meu horário preferido...

Os porteiros estão pra trocar de turno,
pois claro já está,
mas o frescor do dia
está apenas a raiar.

Os meus passos sobem a rua - 
sozinhos.
E ecoam pela rua -
sozinhos.

Não escuto nada a não ser meus passos vazios...
Minha voz já não será tão branda,
minha vida já não terá essa calma,
meus ouvidos já terão esquecido o sabor do meu sapato no chão...

Seis horas da manhã é meu horário preferido do dia.

Só escuto meus passos
e ninguém a reclamar.
Só escuto meus pensamentos
ainda matinais a pensar...

Ao meu ritmo
- sonolento ritmo -
subo a rua na companhia do soar de passos.

Seis horas da manhã é meu horário favorito do dia...

simplesmente porque
é a única hora que aprovo 
a direção para que os passos me levam.

domingo, 8 de março de 2009

25 de março

Sentou na calçada esperando que o sol diminuisse sua fervura. Nem ao menos um sinal de uma brisa, morna que fosse; nada. Imaginou-se na chuva, soterrado de água, por mais improvável que fosse, preferia estar nas águas do rio Tietê.
Respirou fundo com o ar quente machucando seus pulmões e resolveu procurar uma sombra, mas ao meio-dia elas são alucinações. Nenhum sinal do seu ônibus. A idéia de pegar o transporte abafado, a idéia de passar uma hora - sendo otimista - lá naquele calor o fez pensar no tão querido inverno.
Ah, o inverno. Sua cabeça era mais leve no inverno, ou melhor, menos quente. Se irritava menos, estava no fundo, mais feliz.
E finda o verão.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Do you wanna dance?

Música eletrônica. A maior festa. Ninguém escuta nada exceto as batidas frenéticas.
Rock. A maior zona. Ninguém escuta nada exceto os gritos de revolução.
Bossa nova. O maior romance. Ninguém escuta nada exceto as batidas dos corações apaixonados.
Um concerto. A maior intelectualidade. Ninguém escuta nada exceto o suor do maestro no suporte da partitura.
Um errado. A maior tristeza. Ele não escuta o mundo porque está errado.

domingo, 1 de março de 2009

Lendo o futuro

O ônibus corria e sua mente estava em alguma esquina. Já fora atropelada pelas rodas enlouquecidas daquele ônibus.
O dia mal se levantara e pelo visto o motorista só fizera isso e esquecera de acordar.
Era sempre uma emoção fazer aquele caminho.
Mas ele nem se incomodava mais... Chegava a ser prazeroso o pra lá e pra cá... Quase um cerimonial.
Estranho foi o dia que o ônibus não parou de solavanco e não jogou os passageiros em cima uns dos outros sequer uma vez. E aquele dia foi o mais bizarro da sua vida.
Talvez o ônibus tenha sido um preságio.